As lesões císticas pancreáticas apresentam incidência cada vez mais elevadas, e podem ser achados incidentais de exames de imagem abdominal por causas inespecíficas. Atualmente cerca de 2,5% dos pacientes submetidos a exames de imagem apresentam lesões císticas. São divididas em pseudocistos, cistos não-neoplásicos e cistos neoplásicos, que incluem cistoadenoma seroso, cistoadenoma mucinoso e neoplasia mucinosa papilar intraductal (IPMN).
Uma boa avaliação destas lesões é adequada em casos sintomáticos e em neoplasias císticas que possuem potencial maligno.
O diagnóstico dessas lesões deverá ser realizado com exames de imagem, associados a características clínicas, ecoendoscópicas, citológicas e análise do conteúdo líquido em seu interior.
A ecoendoscopia ou ultrasom endoscópico é um método diagnóstico que possui maior sensibilidade em lesões menores que 2 cm, e que permite a punção aspirativa do conteúdo cístico. No líquido aspirado os exames normalmente realizados são a citologia (para pesquisa de células neoplásicas), dosagem bioquímica de amilase, antígeno carcinoembrionário (CEA), marcador tumoral CA 19-9 (líquido cístico) e glicose. Outras avaliações específicas podem ser realizadas na dependência da principal hipótese diagnóstica. O exame histológico também pode ser realizado a partir de fragmentos de tecido obtidos pela punção com agulha fina através da ecoendoscopia.
Cistoadenoma seroso
O cistoadenoma seroso do pâncreas é uma lesão benigna, sendo a degeneração maligna rara, mas pode ocorrer em menos de 1% dos casos. Localiza-se em qualquer região pancreática, mas é mais frequente na cabeça pancreática. Pode estar associado a síndrome de Von Hippel Lindau. Acontece em ambos os sexos, mas é mais prevalente em mulheres na faixa etária de acima dos 50 anos.
A ecoendoscopia é um dos melhores exames para a sua avaliação e pode ser utilizada em seu seguimento, embora a tomografia e a ressonância sejam o método de escolha. A cápsula pode ser hipervascularizada e áreas de calcificação (star calcification ou sunburst sign) podem estar presentes. Raramente ser comunicam com os ductos pancreáticos e são septadas. Por apresentar características microcísticas (honeycomb – favo de mel), a obtenção de material para análise pode ser difícil. Raramente apresenta-se como um cisto único – oligocístico-macrocístico. Geralmente a dosagem do CEA está abaixo de 192, com amilase baixa e ausência de mucina. O líquido aspirado apresenta baixa viscosidade e aspecto serohialino ou serohemático. Na citologia verifica-se a presença de células cubóides.
O tratamento cirúrgico está indicado nos casos em que há sintomas, dúvida diagnóstica ou quando os cistos crescem rapidamente. Alguns grupos recomendam a retirada cirúrgica, via laparoscópica em lesões maiores que 4cm.
Neoplasia sólida cística pesudopapilar – Tumor de FRANTZ
Representa 3% das neoplasias pancreáticas e com baixo grau de agressividade, embora metástases possam ocorrer em 15% dos casos. Mais frequente em mulheres jovens, na faixa etária dos 30 anos, na cauda pancreática, mas podem ser do corpo e cabeça pancreática. Na maior parte dos casos (80%), os pacientes apresentam sintomas como dor abdominal e sensação de massa ou inchaço. Os marcadores tumorais sorológicos em geral estão normais.
As características a ecoendoscopia são: ecogenicidade mista, com cápsula bem delimitada e que raramente se comunicam com ductos pancreáticos. Áreas de degeneração, necrose e hemorragia podem estar presentes a ecoendoscopia.
A ecoendoscopia com punção por agulha fina permite o diagnóstico em cerca de 50% dos casos. A citologia verifica-se a presença de células com citoplasma eosinofílico e núcleo arredondado. As células formam ramificações papilares sobre o estroma mixóide fibrovascular e a parte cística contém material necrótico e fluido com sangue escurecido. Os marcadores imunohistoquímicos auxiliam na confirmação diagnóstica. Os principais marcadores são: alfa-1 antitripsina, receptores de progesterona, vimentina, neuro enolase, CD10, CD56 e beta-catenina.
O tratamento é a ressecção cirúrgica, obtendo cura em 95% dos casos.
CISTOADENOMA MUCINOSO
O cistoadenoma mucinoso pode apresentar comportamento benigno, bordeline ou maligno (cistoadenocarcinoma mucinoso). Semelhantes ao tumor ovariano, apresentam epitélio colunar e receptores para estrogênio e progesterona. Na maior parte dos casos ocorrem em mulheres jovens, 30-40 anos, sendo mais frequentes no corpo e cauda pancreática.
Geralmente apresenta-se como lesão única, podendo estar associado a projeções papilares internas, nódulos murais e calcificações na sua cápsula (Egg Shell – casca de ovo) achados normalmente correlacionados a malignidade. O fluido normalmente mucoide e claro, com CEA acima de 192, CA19.9 abaixo de 37 e amilase baixa. Na citologia verifica-se presença de estroma ovariano ao redor do tumor, com uma camada de células produtoras de mucina, que são patognomônicos da patologia.
O tratamento de escolha é o cirúrgico com ressecção da neoplasia.
NEOPLASIA INTRADUCTAL PAPILAR PRODUTORA DE MUCINA (IPMN)
Os IPMNs são lesões que se originam e acometem os ductos pancreáticos e produzem mucina. São mais frequentes em homens acima dos 60 anos, em geral acomentendo a cabeça pancreática. Podem ser originar do ducto pancreático principal – Ducto de Wirsung ou de ductos secundários.
Caracterizados por dilatações císticas dos ductos pancreáticos, podendo ter conteúdo sólido em seu interior. Na ecoendoscopia pode-se dividir nos tipos: MDN-ducto principal (dilatação do Wirsung, com sinal endoscópico da boca-de-peixe), BD-ductos secundários (aspecto de cacho-de-uvas) e misto. A classificação de IPMN de ducto principal ou secundário é baseada principalmente no tamanho do ducto pancreático principal. Quando o seu tamanho está acima de 5mm, segmentar ou difuso, é altamente sugestiva de IPMN de ducto principal. Assim, na ausência de dilatação do ducto principal ou um cisto maior que 5mm que comunica com o ducto principal é sugestivo de IPMN de ducto secundário.
O fluido tem característica mucoide e clara, com CEA e amilase elevados. Possuem alto potencial de malignidade, podendo progredir de adenoma até carcinoma invasivo. Endoscopicamente pode ser visualizada a saída de mucina pela ampola de Vater.
O seguimento varia de acordo com características e tipo histológico, porém não há protocolo definitivo. Após a histopatologia confirmar cistoadenoma seroso, não é necessária avaliação adicional se assintomáticos. Nos demais casos, irá depender de alguns fatores como: suspeita ou diagnóstico de neoplasia na citopatologia, cisto mucinoso maior que 3 cm com mudança no calibre do ducto pancreático ou nódulos naturais e/ou marcadores genéticos positivos. Estes devem-se avaliar a possibilidade da indicação cirúrgica para paciente, conforme localização anatômica da lesão. Se não haver algum dos fatores citados, pode-se fazer o seguimento com exames de imagem complementares (tomografia computadorizada, ressonância magnética ou ecoendoscopia) com intervalos pré-estabelecidos.
A Reunião de Consenso Internacional de Fukuoka estabelece alguns critérios para tratamento cirúrgico e seguimento:
-IPMN de ducto principal ou secundário com sinais invasivos ou pacientes sintomáticos, devem ser operados;
-IPMN de ducto principal ou secundário e com estigmas de alto risco como: icterícia, componente sólido em cistos, ducto pancreático principal maior que 10mm, devem ser operados;
-IPMN de ducto principal ou secundário e com achados preocupantes como: cisto maior que 3cm, paredes espessadas, ducto principal entre 5-9mm, nódulos murais, atrofia do pâncreas e gânglios linfáticos aumentados, devem realizar punção com agulha fina. Se no exame de ECOENDOSCOPIA evidenciar lesões murais, paredes espessadas, mucinas intraductais ou citologia que confirme ou seja suspeita para malignidade, devem ser operados;
-IPMN de ducto secundário com os seguintes critérios: menores que 3cm, ducto principal menor que 10mm, sem nódulos murais e citologia benigna podem ser acompanhados.
A ecoendoscopia tem sido o exame de escolha para a avaliação complementar das lesões císticas pancreáticas. Exame pouco invasivo, que permite a realização de punção para análise de fragmentos por histopatologia e citologia, associado a imuno-histoquímica. A análise laboratorial do líquido complementa e orienta os prováveis diagnósticos.
Dr. Eduardo de Barros Baruki – Fellow Research I. EndoVitta – Endoscopista – CRM 176.295 e
Responsável Técnico – Dr. Thiago F. de Souza – CRM 110219